Doutrina Católica
A consagração total a Jesus por Maria segundo São Luís de Montfort
por Thiago Zanetti em 20/06/2025 • Você e mais 551 pessoas leram este artigo Comentar

Tempo de leitura: 5 minutos
A consagração total a Jesus pelas mãos de Maria, conforme ensina São Luís Maria Grignion de Montfort, é uma das práticas espirituais mais profundas e transformadoras da tradição católica. Não se trata apenas de uma devoção mariana, mas de um caminho seguro, rápido e eficaz de santificação, como o próprio santo afirma em seu clássico espiritual Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem.
O que é a consagração total?
Consagrar-se totalmente a Jesus por Maria é reconhecer que Maria Santíssima, por desígnio de Deus, tem um papel essencial na nossa união com Cristo. São Luís resume essa consagração como uma entrega radical e irrestrita, não apenas dos bens exteriores, mas também dos interiores e espirituais.
Ele escreve:
“Esta devoção consiste, pois, em se dar por inteiro à Santíssima Virgem para ser, através d’Ela, inteiramente de Jesus Cristo” (Tratado da Verdadeira Devoção, n. 121).
Essa entrega inclui corpo, alma, bens materiais, méritos espirituais e até os frutos de nossas boas obras, em total confiança na mediação maternal de Maria.
A verdadeira devoção: não é sentimentalismo
Ao contrário de um sentimentalismo superficial, a consagração proposta por Montfort exige decisão firme e perseverança. Ele distingue entre falsas e verdadeiras devoções à Virgem Maria, alertando contra práticas ocasionalistas e vazias de comprometimento real.
“Há sete tipos de falsos devotos e de falsas devoções à Santíssima Virgem, a saber: os devotos críticos; os devotos escrupulosos; os devotos exteriores; os devotos presunçosos; os devotos inconstantes; os devotos hipócritas; os devotos interesseiros” (Tratado da Verdadeira Devoção, n. 92).
A consagração é, na verdade, uma escravidão de amor. Montfort não tem receio de usar esse termo, mas o faz com precisão teológica e bíblica, lembrando que somos “escravos de Cristo” por amor, como São Paulo também se declarou (cf. Rm 1,1).
“digo habitualmente: escravo de Jesus em Maria, escravidão de Jesus em Maria. Pode-se, na verdade, como vários o fizeram até aqui, dizer-se escravo de Maria, escravidão da Santíssima Virgem. Parece-me, contudo, preferível dizer escravo de Jesus em Maria” (Tratado da Verdadeira Devoção, n. 244).
E continua
“(…) vale mais dizer escravidão de Jesus em Maria, e dizer-se escravo de Jesus Cristo, do que escravo de Maria. Assim denomina-se esta devoção mais de acordo com o seu fim último, que é Jesus Cristo, do que com o caminho e meio para lá chegar, que é Maria. Embora se possa, na verdade, usar uma ou outra denominação, sem escrúpulos, como eu faço” (Tratado da Verdadeira Devoção, n. 245).
Por que Maria?
São Luís ensina que Deus escolheu vir ao mundo por meio de Maria, e que esse é o caminho que Ele deseja que sigamos até hoje. Tudo em Cristo passou por Maria; e, segundo Montfort, tudo em nós também deveria passar por ela.
“Foi pela Santíssima Virgem Maria que Jesus Cristo veio ao mundo, e é também por Ela que Ele deve reinar no mundo” (Tratado, n. 1).
Essa lógica divina — de vir ao mundo por meio de Maria — permanece válida para cada cristão que deseja se unir plenamente a Cristo.
Frutos da consagração
A entrega total a Jesus por Maria gera frutos concretos na vida espiritual do fiel. São Luís enumera algumas dessas graças:
- Conhecimento mais profundo de si mesmo;
- Maior união com Cristo;
- Ação mais pura do Espírito Santo;
- Perseverança na fé.
Ele afirma com clareza:
“A Santíssima Virgem, que é uma Mãe toda doçura e misericórdia, nunca se deixa vencer em amor e liberdade. Por isso, quando vê que alguém se lhe dá totalmente para a honrar e servir, despojando-se do que tem de mais querido para a amar, dá-se também, inteiramente e duma maneira inefável, a quem tudo lhe deu” (Tratado da Verdadeira Devoção, n. 144).
O método de preparação
Montfort propõe uma preparação espiritual de 33 dias antes da consagração, divididos em quatro etapas:
- 12 dias para “livrar-se do espírito do mundo”
- 7 dias para “conhecer a si mesmo”
- 7 dias para “conhecer a Santíssima Virgem”
- 7 dias para “conhecer Jesus Cristo”
Essa preparação não é mero ritual, mas um itinerário de purificação interior e aprofundamento da fé. Ao final do processo, realiza-se a consagração com uma oração escrita pelo próprio santo, que é um verdadeiro ato de entrega total:
“Eu, …, infiel pecador, renovo e ratifico hoje, em vossas mãos, os votos do meu Batismo. (…) dou-me inteiramente a Jesus Cristo, a Sabedoria encarnada, para segui-Lo levando minha Cruz em todos os dias de minha vida. E a fim de Lhe ser mais fiel do que até agora tenho sido, escolho-Vos hoje, ó Maria Santíssima, em presença de toda a corte celeste, para minha Mãe e minha Senhora” (Tratado, texto da Consagração, 220).
O papel da Eucaristia e da Cruz
A consagração, segundo Montfort, conduz a uma vivência mais profunda da Eucaristia e da Cruz. O cristão consagrado a Maria é chamado a unir-se mais intimamente ao sacrifício de Cristo, a carregar sua cruz com paciência e amor.
“é bem verdade que os mais fiéis servos da Virgem Maria, sendo seus maiores favoritos, recebem d’Ela as maiores graças e favores do Céu, que são as cruzes. Mas sustento que são também esses servos de Maria que carregam aquelas cruzes com mais facilidade, mérito e glória” (Tratado da Verdadeira Devoção, n. 154).
A cruz deixa de ser apenas um fardo e passa a ser instrumento de salvação, conforme o exemplo da própria Virgem Maria, que permaneceu de pé aos pés da cruz.
A segurança do caminho mariano
Para Montfort, esse é o caminho mais seguro para chegar a Jesus:
“Ela (Maria) é o meio mais seguro, mais fácil, mais curto e mais perfeito para chegar a Jesus Cristo” (Tratado, n. 55).
Essa segurança não vem de um privilégio automático, mas da fidelidade de Maria à vontade de Deus. Por isso, o santo afirma que se nos confiarmos a ela com humildade e constância, não nos perderemos:
“Quando Ela vos sustém, não caís, quando vos protege, nada temais; quando vos conduz, não vos cansais; quando vos é favorável, chegais ao porto da Salvação – São Bernardo” (Tratado, n. 174)
A consagração total a Jesus por Maria, segundo São Luís de Montfort, é um caminho de renovação radical da vida cristã. Longe de ser uma devoção isolada, ela envolve toda a existência e transforma profundamente o coração do fiel.
Montfort não promete facilidades, mas garante frutos de santidade e união com Cristo. E é por isso que, até hoje, sua espiritualidade continua a inspirar milhões de fiéis, inclusive grandes santos como São João Paulo II, que adotou o lema mariano de Montfort como lema de vida: “Totus Tuus”.
“Tuus totus ego sum, et omnia mea tua sunt (Sou todo vosso, e tudo o que tenho vos pertence)”
(São Luís de Montfort, Tratado da Verdadeira Devoção, n. 233)

Por Thiago Zanetti
Jornalista, copywriter e escritor católico. Graduado em Jornalismo e Mestre em História Social das Relações Políticas, ambos pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). É autor dos livros Mensagens de Fé e Esperança (UICLAP, 2025), Deus é a resposta de nossas vidas (Palavra & Prece, 2012) e O Sagrado: prosas e versos (Flor & Cultura, 2012).
Acesse o Blog: www.thiagozanetti.com.br
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