Catecismo
Cultura do imediatismo. A geração conectada com dificuldade de rezar
por Thiago Zanetti em 18/07/2025 • Você e mais 87 pessoas leram este artigo Comentar

Tempo de leitura: 6 minutos
Vivemos na era do toque instantâneo. Um clique pede comida. Outro chama um carro. Um deslizar do dedo atualiza a vida de centenas de pessoas em segundos. O tempo desacelerado da interioridade parece incompatível com a urgência digital do agora. Dentro desse contexto, muitos católicos — especialmente os mais jovens — sentem dificuldade de rezar. Mas por que isso acontece?
A resposta está naquilo que Bento XVI chamou de “cultura da impaciência”, que mina a perseverança e o silêncio necessários à vida espiritual.
“O mundo é redimido pela plenitude de Deus e destruído pela impaciência dos homens”.
(Santa Missa pelo início do Ministério de Sumo Pontífice Bento XVI. Homilia de Sua Santidade Bento XVI. Praça de São Pedro, domingo, 24 de abril de 2005).
O tempo da oração é diferente do tempo digital
A oração cristã não acontece no ritmo dos algoritmos. Ela exige pausa, atenção e perseverança — três virtudes que vão na contramão da lógica digital. A oração é um diálogo, não uma notificação. Ela é resposta ao chamado de Deus, não uma resposta automática a estímulos.
“A oração é a elevação da alma a Deus ou o pedido a Deus dos bens convenientes” (CIC 2559).
Mas como elevar a alma a Deus se a mente está constantemente distraída?
A geração conectada vive sob o domínio de estímulos constantes. Essa hiperexposição gera o que especialistas chamam de “atenção fragmentada”, dificultando manter o foco em uma única atividade por muito tempo. A oração, que exige recolhimento e continuidade interior, se torna um desafio.
O impacto do imediatismo na vida espiritual
A cultura do imediatismo ensina que tudo deve acontecer rápido, sem esforço e com resultados visíveis. Esse pensamento, porém, é contrário à lógica do Reino de Deus, que opera em tempos e modos diferentes dos nossos.
“O Reino de Deus não vem ostensivamente” (Lucas 17,20).
O imediatismo gera frustração na oração. A pessoa espera sentir algo “na hora”, obter respostas “na hora”, experimentar consolo “na hora”. Quando isso não acontece, pensa que está rezando errado ou que Deus não está ouvindo. Desiste.
Esse pensamento utilitarista é um reflexo da cultura do clique: se não gera resultado imediato, perde valor. Mas a oração não é um botão de emergência. Ela é uma relação de amor.
“A oração é um dom da graça e uma resposta decidida da nossa parte” (CIC 2725).
O silêncio que assusta
A oração nos leva ao silêncio interior. Mas a geração digital tem medo do silêncio. O silêncio incomoda, revela feridas, exige enfrentamento. E, no ruído das redes, é fácil se esconder de si mesmo.
“O silêncio, a oração e a concentração são exercícios difíceis, e por vezes a natureza humana rebela-se. Preferiríamos estar em qualquer outra parte do mundo, mas não ali, naquele banco de igreja a rezar. Quem quiser rezar deve lembrar-se de que a fé não é fácil, e por vezes procede na quase total obscuridade, sem pontos de referência. Há momentos da vida de fé que são obscuros e por isso alguns Santos definiu-os: ‘A noite escura’, pois não se sente nada. Mas eu continuo a rezar” (Papa Francisco, Audiência Geral, 12 de maio de 2021).
A dificuldade de rezar não vem da falta de boa vontade, mas da ausência de espaço interior. É preciso reaprender a habitar o silêncio, não como um vazio, mas como um encontro.
Quando tudo é urgente, nada é eterno
A lógica digital cria um falso senso de urgência. Tudo parece ser para “agora”, tudo precisa de resposta imediata. Mas a oração nos ensina a esperar. A esperar em Deus. A confiar no tempo de Deus.
“É pela vossa perseverança que conseguirei salvar a vossa vida” (Lc 21,19).
A geração conectada precisa recuperar a dimensão eterna da vida. A oração não é um exercício de produtividade, mas de comunhão. E comunhão leva tempo. É como o crescimento de uma árvore — imperceptível dia a dia, mas transformador a longo prazo.
Como superar a dificuldade de rezar?
A Igreja nos oferece caminhos concretos para vencer a distração, a impaciência e o imediatismo na oração:
1. Começar com pequenos passos
Não é preciso rezar uma hora de uma vez. Comece com cinco minutos diários. Crie o hábito antes de querer sentir grandes efeitos.
“O ‘combate espiritual’ da vida nova do cristão é inseparável do combate da oração” (CIC 2725).
2. Escolher um lugar e um horário fixo
A repetição ajuda a mente a se organizar. Crie uma rotina de oração. Evite rezar enquanto navega no celular ou com estímulos ao redor.
3. Usar a Palavra de Deus como ponto de partida
A Bíblia é fonte viva para a oração. Comece com os Salmos ou o Evangelho do dia. A leitura meditativa (Lectio Divina) é um excelente caminho.
“Lembrem-se, porém, de que a leitura da Sagrada Escritura deve ser acompanhada de oração” (CIC 2653).
4. Aceitar que haverá distrações
Distrações não são sinal de fracasso. São parte do processo. Não lute contra elas com raiva. Traga seu pensamento de volta com mansidão.
“A dificuldade de nossa oração é a distração” (CIC 2729).
A geração conectada pode aprender a rezar
A boa notícia é que a dificuldade de rezar não é um problema sem solução. A graça de Deus é mais forte que qualquer distração. O Espírito Santo é quem nos ensina a orar — mesmo em meio às pressões da cultura moderna.
“O Espírito vem em socorro de nossa fraqueza. Pois não sabemos o que pedir nem como pedir” (Rm 8,26).
A geração hiperconectada é também uma geração sedenta de sentido. Muitos estão cansados do barulho, do excesso e da superficialidade. A oração oferece um caminho de volta ao essencial. Não como um refúgio escapista, mas como um reencontro com a própria alma.
A cultura do imediatismo torna a oração difícil, mas não impossível. A geração conectada está chamada a fazer uma escolha: continuar refém da velocidade ou buscar a profundidade. Rezar é ir na contramão do mundo para voltar ao coração de Deus.
E como nos recorda Santa Teresa de Jesus:
“Nada te perturbe, nada te espante, tudo passa. Deus não muda. A paciência tudo alcança” (Santa Teresa d’Ávila).

Por Thiago Zanetti
Jornalista, copywriter e escritor católico. Graduado em Jornalismo e Mestre em História Social das Relações Políticas, ambos pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). É autor dos livros Mensagens de Fé e Esperança (UICLAP, 2025), Deus é a resposta de nossas vidas (Palavra & Prece, 2012) e O Sagrado: prosas e versos (Flor & Cultura, 2012).
Acesse o Blog: www.thiagozanetti.com.br
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