Doutrina Católica
Maria Corredentora: o que a Igreja ensina (e o que não ensina)
por Thiago Zanetti em 16/06/2025 • Você e mais 177 pessoas leram este artigo Comentar

Tempo de leitura: 6 minutos
Entre os títulos mais ricos da mariologia católica, destaca-se o de Maria Corredentora. Embora ainda não definido como dogma, ele expressa a fé de muitos santos, teólogos e pontífices no papel singular da Virgem Maria na obra da redenção. Longe de concorrer com Cristo, esse título manifesta a verdade de que Maria cooperou livremente com a vontade divina — desde o Fiat da Encarnação até o Calvário — sempre de forma subordinada e dependente de seu Filho, o único Redentor.
O que significa “Corredentora”?
A palavra “corredentora” vem do latim co-redemptora, e seu prefixo co – não significa o significa “igual a” ou “em pé de igualdade”, mas “junto com”, “em cooperação com”.
Assim, quando teólogos chamam Maria de Corredentora, estão se referindo ao seu papel singular de cooperação com Cristo na obra da redenção, e não a uma redenção paralela ou independente.
Essa cooperação é sempre subordinada, derivada e dependente do único Redentor: Jesus Cristo.
O Papa Bento XVI disse:
“Acompanha-nos neste itinerário a Virgem Santa, que seguiu em silêncio o Filho Jesus até ao Calvário, participando com grande dor no seu sacrifício, cooperando assim no mistério da Redenção e tornando-se Mãe de todos os crentes (cf. Jo 19, 25-27)” (Audiência Geral, 8 de abril de 2009).
Maria participou da redenção?
Sim, segundo a doutrina católica, Maria participou de forma única na obra redentora, mas não como autora da redenção — papel exclusivo de Cristo.
O Catecismo da Igreja Católica (n. 618) ensina:
“A Cruz é o único sacrifício de Cristo, ‘único mediador entre Deus e os homens’ (1Tm 2,5).” No entanto, os fiéis podem ser “associados ao Mistério Pascal” e participar da sua missão.
Maria, como Mãe de Jesus e discípula perfeita, teve essa associação de forma especial e íntima, como reconhecem diversos santos e doutores da Igreja.
O título de Corredentora é um dogma?
Não. A Igreja nunca proclamou oficialmente o título de “Corredentora” como dogma.
Apesar de muitos teólogos o utilizarem desde os séculos XV e XVI, e de São João Paulo II mencioná-lo ao menos sete vezes em seus discursos, o Magistério ainda não reconheceu esse título como definição dogmática.
Inclusive, o Papa Francisco tratou do tema em sua homilia na Missa de Nossa Senhora de Guadalupe, em 12 de dezembro de 2019. Ele afirmou:
“Fiel ao seu Mestre, que é o seu Filho, o único Redentor, jamais quis reter para si algo do seu Filho. Nunca se apresentou como corredentora. Não, discípula!” (Papa Francisco, Homilia – 12 de dezembro de 2017).
Essa declaração indica uma clara prudência teológica por parte de Francisco em relação ao uso oficial desse título.
O que a Igreja ensina positivamente sobre a mediação de Maria?
A Igreja reconhece que Maria exerce um papel de mediação subordinada. O Concílio Vaticano II, na constituição Lumen Gentium, afirma:
“Esta função subordinada de Maria, não hesita a Igreja em proclamá-la; sente-a constantemente e inculca-a aos fiéis, para mais intimamente aderirem, com esta ajuda materna, ao seu mediador e salvador.” (LG, n. 62)
Esse trecho deixa claro que Maria intercede como Mãe, mas não como mediadora absoluta, o que pertence somente a Cristo. Ela é medianera no sentido de “ponte”, não de “origem”.
E o que a Igreja não ensina sobre Maria Corredentora?
- Maria não redimiu a humanidade por seus próprios méritos.
A Igreja ensina que a redenção é obra exclusiva de Cristo (cf. Hb 9,12). - Maria não é coautora da salvação.
Mesmo colaborando de forma singular, ela permanece criatura — agraciada, mas totalmente dependente de Deus. - Maria não é mediadora igual a Cristo.
Ela é medianera no sentido participativo e maternal, mas jamais substitutivo. - Maria não é necessária à salvação.
Sua mediação é poderosa, mas não é necessária como condição absoluta, pois Deus poderia ter redimido o mundo sem ela, embora tenha querido incluí-la livremente em Seu plano.
O valor espiritual do título
Apesar das reservas doutrinárias, muitos papas e santos doutores da Igreja exaltaram esse papel corredentor de Maria — sem jamais colocar em risco a unicidade da mediação de Cristo.
Como já falamos, São João Paulo II o fez diversas vezes em seus discursos. São João Paulo II afirmou assim:
“Maria, enquanto concebida e nascida sem a mancha do pecado, participou de forma admirável nos sofrimentos do seu divino Filho, a fim de ser Corredentora da Humanidade”.
A frase foi dita em sua saudação aos enfermos após a audiência geral de 8 de setembro de 1982.
Já Santo Agostinho atribui à Virgem a qualificação de ‘cooperadora’ da Redenção.
Esses títulos devem ser lidos dentro de seu contexto espiritual e devocional, e não como afirmações dogmáticas.
A prudência da Igreja e a sabedoria do Magistério
A razão pela qual a Igreja ainda não aprovou oficialmente o título de Corredentora é pastoral e teológica: evitar interpretações erradas que possam sugerir um dualismo redentor entre Cristo e Maria.
A Igreja, portanto, prefere usar expressões já consagradas, como “Mãe da Igreja”, “Medianeira”, “Advogada” e “Auxiliadora”, que são mais claras e universalmente aceitas.
Maria, cooperadora sim; redentora, não
A devoção à Virgem Maria é um tesouro inestimável da fé católica. Ela é, de fato, a Mãe do Redentor, a nova Eva, a Mulher do Apocalipse e modelo perfeito de fé. Porém, é necessário manter claro que ela é colaboradora, nunca rival de Cristo.
Jesus é o único Salvador. Maria cooperou com amor, dor e fé incomparáveis — mas sempre como discípula, serva e Mãe.
Em tempos de confusão teológica, é preciso retornar às fontes: à Sagrada Escritura, ao Magistério e ao coração da Igreja. Só assim manteremos a verdadeira honra a Maria, que não se dá elevando-a indevidamente, mas amando-a como Jesus a ama — sem exageros e sem reduções.

Por Thiago Zanetti
Jornalista, copywriter e escritor católico. Graduado em Jornalismo e Mestre em História Social das Relações Políticas, ambos pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). É autor dos livros Mensagens de Fé e Esperança (UICLAP, 2025), Deus é a resposta de nossas vidas (Palavra & Prece, 2012) e O Sagrado: prosas e versos (Flor & Cultura, 2012).
Acesse o Blog: www.thiagozanetti.com.br
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